terça-feira, 30 de agosto de 2011

A menininha que mora em mim

Quando eu era criança vivia sonhando com o dia que eu seria uma mulher de trinta. A idade de pensar que o melhor jeito de crescer era virar a mulher gato, mulher maravilha ou uma das panteras, já tinha passado. Só me restava a vida real.
Vocês sabem que criança se vira! O problema era que o mundo não fazia sentido nenhum. As músicas, as propagandas de TV, os meus cipós para vôos certos à vida de mulher, se enroscavam em um nó de informações.
Beth Frígida (se lembram dessa música?) para mim era um erro do cantor! Na verdade ele queria dizer Beth fri-gi-dei-ra. A lição aqui era relaxar para fritar coisas. Misterioso, mas muito preciso.
Ainda na onda da liberação dos temas sexuais do final dos anos oitenta e suas músicas, tinha uma que eu adorava: “Moreno, alto, bonito e sensual. Talvez eu seja a solução dos seus problemas...” E eu pensava: “Ótimo! Se quando eu for adulta algum menino me levantar a saia na hora do recreio, eu ligo logo para esse moreno alto aí!”
Uma que passei anos com medo foi aquela da gatinha manhosa do querido Leo Jaime. Eu achava a música linda, com aquele homenzão sussurrando, mas não me deixava enganar: “Se o cara te chama de gatinha, ele quer te prender!”. Uma pressão terrível!
Minha amiga conta que lá pelos seus 12 anos tinha acessos de riso com o trecho da música do Djavan: “Mais fácil aprender japonês em braile, do que você decidir se dá ou não”. Ela achava graça por que ele não dizia o que queria que ela desse. O Bobão podia sair perdendo se a menina fosse esperta!
As propagandas também eram incompreensíveis. Tinha aquela do desodorante impulse, se lembram? “Se milhões de homens vierem atrás de você, isso é IMPULSE”. E eu, que via que na hora do recreio todos os meninos fugiam das meninas, ouvia a propaganda assim: se milhões de homens vieram atrás de você... isso é IMPUL-SÍVEL! Coitadinha.
Mas aí o tempo passa. Mesmo. A gente faz trinta anos mesmo. As coisas vão acontecendo, as vezes podem se desmoronam e as vezes as nuvens se dissipam e o sol volta a brilhar. Aquela menininha estranha que me habitava no peito foi diminuindo...sumindo... Sumindo nada!
Ainda acho impossível que milhões de homens venham atrás de mim por causa de um desodorante, ligo sempre para o meu moreno alto quando alguém me incomoda no recreio e sinto um pequeno medo quando ele me chama de gatinha. E para usar uma frigideira é preciso muita calma mesmo. Ah não. Não era frigideira...

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